quinta-feira, 17 de abril de 2008

A Esparrela Ambiental




Contribuição à Discussão dos Limites Inclusivos da Lagoa de Itaipu
no Parque estadual da Serra da Tiririca - PEST

Sobre os limites e delimitações do Parque Estadual da Serra da Tiririca – PEST, eminentes atores institucionais do movimento social em Niterói têm sido sistematicamente enganados e caído em esparrelas políticas, óbvia e descaradamente associadas aos interesses da especulação imobiliária, principal vetor da degradação ambiental na cidade. Do ponto de vista da preservação ambiental, os resultados obtidos em quase duas décadas de debates intermináveis caminham do medíocre para o catastrófico. Não se têm notícias de ganhos ambientais efetivos na Serra da Tiririca, senão somente permanentes perdas territoriais. Aliás, tônica em todas as outras áreas protegidas por lei em toda a cidade. Nessas matérias, o movimento social pouco ou quase nada formula e/ou propõe, menos ainda executa efetivamente quaisquer projetos, senão apenas eventos ridículos, paliativos e analgésicos para limpar a sujeira de um crescimento urbano desordenado, dando palco para a propaganda e promoção de políticos corruptos. Passam a vida correndo atrás de prejuízos e reagindo ao estímulo de situações emergenciais, quando ocorrem os escândalos ambientais e os assintes da especulação imobiliária. Em situações limite recorrem ao poder judiciário, que acaba trancando o problema por longo tempo, com manobras processuais e conveniências magistradas, que permitem os esquecimentos e as acomodações proporcionadas pelo tempo.

A inclusão da lagoa de Itaipu no PEST, criando a sandice administrativa de uma terceira área descontínua de uma unidade de conservação, repete a fórmula eficaz que a especulação encontrou para moldar os instrumentos legais a seu bel prazer. A proposta de diminuição dos limites do PEST, que passou após uma década de discussão política, sem técnica alguma ou qualquer legalidade, serviu para apaziguar a fome especulativa de um sem número de interesses econômicos. Repetem agora o que foi a inclusão da segunda área descontínua, o Morro das Andorinhas, cuja comunidade engoliu um dos maiores engodos que já se viu por aqui, que os políticos (paus mandados) armaram, após os particulares fracassarem na efetivação dos seus interesses fundiários.

Após anos a fio de conflitos, opressão e transtornos à comunidade, após acadêmicos, ambientalistas e lideranças comunitárias serem permanentemente pautados pelas discussões e propostas da especulação, através de políticos oportunistas, caíram na esparrela afinal, e decidiu-se pela mudança da situação jurídica do Morro das Andorinhas. O deputado vintenário teve o desplante de afirmar publicamente a aberração legal de que essa inclusão servia para compensar as áreas que estavam sendo subtraídas (injustificadamente!) dos limites originais. Quem perdeu com isso, patrimonialmente, foi a comunidade de pescadores e afins, os verdadeiros donos da terra, porque detentores seculares da posse. Antes, a comunidade ali residente disputava a titularidade com particulares; agora, “disputa” com o Estado, que incorporou a área ao patrimônio público. Ora, quem mais tem poder de influência sobre as ações e decisões do Estado? A comunidade ou os interesses econômicos que cobiçam aquela terra? Com isso, foi decretado tacitamente o fim de uma comunidade com o cessamento de um direito à terra líquido e certo, que eles detinham e que podiam reivindicar plenamente, sem os limites antepostos pelos interesses do Estado. Com isso, é de se supor que criamos mais uma comunidade do Imbuhy na cidade, objeto de opressão, de joguete político e daquele bom e velho murmúrio lucrativo que produz tantas auto-promoções políticas, além de tantas benesses e títulos acadêmicos.

Por outro lado, é de se desconfiar de quaisquer propostas apoiadas ou defendidas pelo deputado vintenário, ora secretário, subsecretariado por um criminoso ambiental conhecido por sua canalhice, que conchavaram com o deputado ex-vice-líder do executivo municipal e ex-líder do legislativo municipal, talvez o maior fraudador legislativo que a Câmara Municipal já conheceu. Este sujeito desarquivou um projeto engavetado na ALERJ pela sua inconstitucionalidade e ausência de embasamentos técnicos aceitáveis, decidiram arbitrariamente sobre sua legalidade e cometeram a maior fraude ambiental dos últimos tempos, quiçá a maior do Brasil. Passaram no rodo uma ilegalidade, de acordo com o formato político habitual da negociata e da manobra, temperada com generosas pitadas de autoritarismo e truculência. Tudo isso com os ingredientes corruptos das fraudes cartoriais, entrega de terras públicas a particulares, acobertamento de invasões e dos mais variados crimes ambientais dolosos. As pouquíssimas intervenções dos órgãos ambientais de controle e fiscalização sempre foram teatrais, porque quase tudo se consolidou e quase nada foi impedido a tempo e a hora quando aconteceu. E tem um monte de cargos comissionados do atual governo envolvidos com isso, criminosos que tomaram de assalto o poder público.

Intervenções técnicas que seriam equivocadas se não fossem intencionais, quase sempre desqualificadas, definiram as condições para transformar uma unidade de conservação em área de expansão urbana, criando um lucrativo balcão de negócios com vultosos volumes de valor patrimonial. Tudo ou quase tudo que se decidiu e se configurou na forma de lei até agora está saindo exatamente de acordo com os interesses da especulação imobiliária, inacreditavelmente, no exato timing e ritmo com que operam as construtoras, empreiteiras, incorporadoras e empreendedores imobiliários em geral.

A dinâmica econômica da especulação é lenta, gradual, consiste em lançar mão e em executar na forma de mercadoria os estoques de terra destinados à expansão urbana, reservas de valor que são cuidadosamente amealhadas no mercado de títulos de domínio sobre áreas não edificantes. O que mais interessa a esses agentes econômicos é que não haja muitas regras e que, quando for para defini-las ou mexer nas regras existentes, que o seja para corrigir alguns impedimentos aos projetos de construção e incorporação. No PEST, o decreto que o delimitou em 1993 sempre foi a única barreira legal para avançar à vontade sobre áreas muito cobiçadas e valiosas. As imagens aéreas da década passada, comparadas com imagens dessa nossa primeira década, mostram um permanente picotamento dos limites, avançando nas áreas que são a bola da vez na corrida imobiliária. É muita Mata Atlântica sendo derrubada, agora, sob a autorização do órgão ambiental. O mercado de laudos técnicos para a ocupação de áreas outrora não edificantes está em alta...

Enquanto foi possível burlar e avançar sorrateiramente sobre os limites de 1993, com eminentes autoridades públicas de competência ambiental acobertando um sem número de crimes dolosos contra o meio ambiente, a especulação não se preocupou em mexer nos instrumentos legais. Mas quando começaram a saturar as ocupações ilegais e os escândalos não pararam mais de pipocar aqui e ali, dando muita bandeira da perversidade e da má fé dos negócios imobiliários, trataram enfim de mudar a regra do jogo e revogaram o decreto de delimitação de 1993, diminuindo a unidade de conservação.

Portanto, a inclusão da lagoa de Itaipu no PEST é mais uma esparrela ambiental que o movimento social está engolindo ingenuamente (ou não!) e, antes mesmo da recente diminuição, essa foi acenada como forma de cooptação para angariar apoios à ilegalidade da diminuição. E eminentes representantes de eminentes instituições do movimento social aceitaram a diminuição sob a promessa de futura proteção da lagoa de Itaipu, incluído-a posteriormente aos limites do PEST. Agora está aí: quando chega a hora de cumprir o acordo, aqueles que prometeram a proteção da lagoa, finalmente, mostraram suas garras corruptas e traíram o movimento social, realizando de fato a inclusão da lagoa, mas devidamente contemplados os interesses da especulação imobiliária, deixando de fora os sambaquis, justamente a área mais cobiçada pela especulação. E o pior de tudo, é a descarada tentativa de burlar uma decisão judicial federal que considerou aquela área como terras de marinha pertencentes à União e impediu a construção de milhares de apartamentos em mais de duas centenas de edifícios.

Por fim, quando se configurava politicamente a aprovação da diminuição do PEST, afirmei a uma dirigente do movimento social na Região Oceânica de Niterói que ela não tinha mais nenhum motivo para se orgulhar diante de seus filhos e netos, porque compactuou com uma fraude escandalosa, um crime contra o meio ambiente sem precedentes, ajudando a preparar o campo para a especulação imobiliária continuar avançando e degradando o meio ambiente na cidade. Afinal? Terá caído de fato numa esparrela política, ou será que agiu deliberadamente, compactuando com o crime ambiental, com a corrupção política e com a especulação imobiliária? Será que existe tanta ingenuidade assim dentre as lideranças e demais participantes do movimento social em Niterói?